terça-feira, 25 de outubro de 2011

A ERA DO PÓS-GÊNERO+CABARET STRAVAGANZA+SATYROS

Uma das novas peças de Os Satyros é "Cabaret Stravaganza"... apesar de eu não ser dado a genialidades, endeusamentos, deslumbramentos, a meu simples e modesto ver, eles O são absurdamente (contemporâneos)...

"CABARET STRAVAGANZA

O projeto performativo "Lou-Leo", uma das cenas do espetáculo "Cabaret Stravaganza", da Cia. de Teatro Os Satyros, tem como proposta a realização de uma mastectomia no ator Leo Moreira Sá. Transexual, Leo, que nasceu Lou, busca a cirurgia para se adaptar a uma nova realidade corpórea e identidade sexual. A performance será viabilizada através de crowdfunding e só acontecerá com a colaboração do público.

Crowdfunding, também conhecido como financiamento colaborativo, consiste na captação de recursos para a viabilização de um projeto artístico, através da Internet.

As etapas do projeto poderão ser acompanhadas aqui, pelo site, passo a passo. Posteriormente, após a estreia da peça, no dia 20 de outubro, o público poderá assistir, através de uma cena, os detalhes da evolução desta jornada, que levará à transformação cirúrgica do corpo do artista Leo Moreira Sá.

http://youtu.be/OiUNaso05fE

HUMANIDADE EXPANDIDA

Escrito por Rodolfo García Vázquez

Pesquisas de grandes multinacionais de computação já indicam que as crianças de hoje sabem brincar melhor com videogames do que andar de bicicleta. Aliás, essas crianças apresentam uma dificuldade muito maior do que gerações anteriores em distinguir a diferença entre o mundo real e o virtual. A utilização dos celulares por esses jovens encontra-se, portanto, em um novo lugar do humano, que também é um outro lugar teatral: eles não são um signo teatral tradicional como um adereço; ao contrário, fazem parte da própria identidade social destes jovens, participando do cotidiano do ator-adolescente e de sua forma de se comunicar com o mundo. São próteses tecnológicas de uma humanidade cibernética. Os antropólogos ciborgues, como Amber Case, diriam que vivemos na condição ciborgue toda vez que agimos através de aparatos tecnológicos como celulares, carros e laptops. Tanto os espectadores quanto os artistas do novo teatro estarão, portanto, marcados pelo espírito ciborgue.
A relação tecnológica da nossa espécie com a natureza marca o processo civilizatório, nos levando a aprender a manipular o fogo e posteriormente a criar os foguetes. A partir dos anos de 1990 especialmente, com a democratização do acesso a muitos aparatos eletrônicos, o advento da internet, o avanço das pesquisas biotecnológicas e da robótica, passamos a um novo patamar da expansão tecnocientífica da humanidade.
O capitalismo do século XXI passou a contar com produtos digitais que geram impérios milionários. Jovens universitários até dez anos atrás, os magnatas do Google, do Facebook e do Twitter criaram o chamado quinto poder. Ao tornar democrático o acesso a novos recursos, os capitalistas digitais criam produtos para um mercado gigantesco ainda em seus primórdios.
Por outro lado, as interferências tanto em nossos próprios corpos quanto na ordem natural estão realizando transformações inéditas. O sequenciamento do genoma humano, as cirurgias plásticas e as pesquisas desenvolvidas por grandes corporações com alimentos transgênicos, visando a alimentação em massa de bilhões de seres humanos, estão nos levando a redefinir a própria relação com a natureza. E a flora e a fauna criadas por Deus em sete dias hoje só continuam a resistir vivas e intactas em áreas de preservação ambiental.
Se a construção da civilização sempre partiu do embate contra a natureza caótica e poderosa, hoje essa mesma natureza, mais do que dominada, passa a ser também construída pela própria humanidade. Assumimos o papel antes reservado ao divino.

O TEATRO EXPANDIDO

O teatro, manifestação superestrutural de tal sistema, vive uma relação intensa e contraditória com ele, ora negando suas influências, mantendo-se fiel à sua história e à preservação de ideais anteriores de humanismo, ora incorporando os elementos deste novo tempo e antecipando tendências. Os temas e os potenciais instrumentais deste universo ultratecnológico estão aí para serem discutidos, incorporados, instrumentalizados, criticados, repensados. Cabe ao teatro descobrir as formas mais adequadas de o fazer.
A força do teatro sempre esteve atrelada à expressão estética de um debate visceral sobre a condição humana. Hoje, paradoxalmente, para discutir o humano, o teatro deve ir para além do humano, para o universo tecnológico, como forma mais poderosa de expressar a condição da humanidade expandida.
Um novo campo teatral começa a nascer, disposto a dialogar com todas as questões que a sociedade contemporânea traz. Fruto da sua época, mas ao mesmo tempo crítico da sua condição, este teatro não se furta do confronto com as imensas dificuldades atuais. A este novo campo teatral, um bebê recém-nascido ainda vulnerável, mas cheio de vitalidade eletrônica, denominaremos teatro expandido.
Este novo teatro pertence ao tempo dos artistas e espectadores expandidos. Curioso sobre os avanços tecnológicos, crítico da desumanização, atento ao surgimento de tantas questões éticas, morais e sociais que o momento atual traz, ele avançará, basicamente, a partir de cinco eixos: o temático, o político, o tecnocientífico, o físico-espacial e o formal. Tais eixos se interpenetram e influenciam mutuamente, trazendo em si problematizações sobre as quais o fazer teatral vai se defrontar nas próximas décadas.

A Era do Pós-Gênero

Escrito por Cynara Menezes (Publicado na Carta Capital)

 

Até os 7 anos, o paulista Leo Moreira Sá, caçula de nove irmãos, brincava com os amigos no quintal, todos meninos, usando um short sem camiseta. No dia que ele conta ser o mais chocante de sua vida, a mãe vestiu-o com o uniforme da escola, uma sainha com blusa. Ele reclamou: “Mas isso é roupa de menina”. Ela olhou-o profundamente nos olhos e pronunciou a frase que o marcaria dali por diante: “Você É uma menina”.
Foram anos de rebeldia, bullying e inadaptação escolar até que Leo, então Lou Moreira, entrou para as Ciências Sociais da USP e descobriu na literatura algumas respostas para suas dúvidas. Ainda assim, continuava a se sentir inadaptada. Entrou para um grupo ativista de lésbicas, mas não se sentia bem aceita por ser considerada “masculina demais”. O melhor momento para ela então foi a atuação, nos anos 1980, como baterista da banda de punk-rock As Mercenárias, look andrógino, cabelo descolorido curtíssimo e ar desafiador.
Em 1995, Lou era casada com uma garota quando viu na rua a travesti Gabriella Bionda, a Gabi. “Pensei: ‘que mulher linda’”, conta. Gabi olhou para ela e falou: “Que ‘viadinho’ bonitinho”. Foi o início da relação surpreendente entre a lésbica e o travesti, que duraria nove anos e tornaria a dupla figurinha carimbada na noite paulistana. O curioso é que houve um período que Gabi “montava” Lou para que esta parecesse mais feminina, mas, nos últimos anos, ela vem se transformando em Leo. Aos 53 anos, planeja, inclusive, fazer a cirurgia de retirada dos seios e, futuramente, de mudança de sexo.
Não que tenha decidido se pretende se relacionar amorosamente com homem, mulher ou outro gênero. “No momento, não estou me relacionando com ninguém, estou pensando só na cirurgia”, diz Leo, para quem Gabi ainda é o amor de sua vida. “A Gabi é minha alma gêmea, meu espelho invertido. Estar com aquela mulher com corpo de homem quebrou certos limites da minha sexualidade. Na cama, éramos o casal mais versátil que se possa imaginar. Hoje, desfruto de um leque muito amplo de possibilidades. Nada está fechado.”
Leo, que toma hormônios, criou barba e possui uma aparência exterior masculina, rejeita assumir a identidade de homem. Não gosta do termo “transexual”, mas prefere se nomear assim, à falta de outro. “Adoraria não precisar assumir gênero algum”, admite o ator, que integra o grupo de teatro dos Sátyros, em São Paulo, cujas montagens costumam incluir transexuais e travestis no elenco. “Vivi à margem durante muitos anos. Agora, ao contrário, essa sensação de não pertencimento ao mundo me faz feliz, sinto-me um ser humano integral, completo. Vou operar para fazer um ajuste, para me sentir mais cômodo com meu próprio corpo. Mas assumir um gênero, para quê?”
Nota de Rodapé: O artista esclarece que LOU sempre foi uma persona imposta pela sociedade e que sua verdadeira identidade sempre foi LEO."

Em: http://www.cabaretstravaganza.com.br/site/  acesso em 25/10/2011.

Abraço afetivo a todos,
Marcos.

 

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