quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

A RESPEITO DO FILME INQUIETOS, O NOVO LONGA DE GUS VAN SANT

REMAR CONTRA A MARÉ: EU TE AMO




Two of us - Beatles
Dois de nós

Two of us
Dois de nós
riding nowhere
dirigindo a lugar nenhum
spending someone´s / hard earned pay
gastando o que foi difícil de alguém ganhar
you and me Sunday driving
você e eu dirigindo no domingo
not arriving
sem chegar
on our way back home
em nosso caminho de volta para casa
we´re on our way home
nós estamos em nosso caminho para casa
we´re on our way home
nós estamos em nosso caminho para casa
we´re going home
nós estamos indo para casa


O novo longa-metragem de Gus Van Sant, Inquietos (Restless, EUA, 2011, 91min), tem como tema aparente a juventude. Contudo, não a juventude ideal e banalizada que usualmente encontramos nos filmes que lançam um olhar sobre os jovens – tais como os da saga Crepúsculo; inclusive, um deles está em cartaz atualmente. Importante esclarecer que não tenho nada contra esse tipo de filme; porém, prefiro a forma de entender/olhar/narrar a vida predominante em filmes como Inquietos, Antes que o Mundo Acabe (Ana Luiza Azevedo), As Melhores Coisas do Mundo (Laís Bodanzky)...   
A primeira questão que me parece relevante do longa-metragem Inquietos é o fato de iniciar-se com um jovem, Enoch (Henry Hopper), rabiscando a sombra de seu corpo no chão, como se tivesse morrido/estivesse morto, ou seja, parece haver alguma obsessão dele/nele em relação à morte. Na sequência, nos damos conta de que ele é um assíduo frequentador de funerais de pessoas desconhecidas. Bom, essas duas situações iniciais são minimamente curiosas dado que o morrer e os velórios não são os temas preferidos dos jovens do mundo atual – é evidente que há suas exceções; porém, penso na maioria dos jovens. Apesar de eu empregar a expressão “mundo atual”, o filme não é situado temporalmente, o que, para mim, aponta sua atemporalidade, universalidade, amplitude... Ao longo do filme, entenderemos essa espécie de “obsessão” de Enoch pela morte e por ir a velórios de pessoas desconhecidas. Em um desses velórios, por uma obra do acaso – ou não –, Enoch cruza com a bela Annabel (Mia Wasikowska), e ela finge que ele é seu namorado para que deixasse de ser “perseguido” por um dos responsáveis por uma dessas cerimônias fúnebres frequentadas por ele. Nesse momento primeiro, ambos são apenas “amigos”; até que, pouco a pouco, essa “amizade” revela-se algo a mais, ou melhor, um percebe estar apaixonado pelo outro. 
Entretanto, como na vida “real” nem tudo, ou quase nada, é cor de rosa, a história de amor entre Enoch e Annabel dificilmente poderá ser levada a cabo dado que ela tem uma doença terminal: câncer no cérebro. Durante o filme, ficamos sabendo que Enoch havia perdido seus pais em um acidente de carro e vivia com uma tia que exerce uma espécie de papel de tutora. Mas Enoch sabe que novamente passará por outra “perda”, isto é, a perda do primeiro/de seu grande amor. A meu ver, esse é um dos temas do filme, ou seja, como aprendemos a lidar com nossas perdas, nossas frustações, nossas desilusões...  
Talvez o filme seja tão interessante por tratar exatamente de jovens que não estão o tempo inteiro manuseando seus celulares, ou vidrados/engalfinhados em sites da/na internet – não quero dizer com isso que a internet não tenha um papel em nossas vidas; porém, começamos a viver tempos absurdamente online e eu prefiro ser um pouco um romântico offline –, ou passeando em shopping centers, ou indo a “baladas”... Quiçás Enoch e Annabel sejam um pouco freak... um pouco gauche (como diria meu mestre Drummond)... um pouco incompreendidos. De minha perspectiva, esse seria outro possível tema do longa-metragem Inquietos, isto é, a incompreensão na juventude e, por que não, em nossas mais diversas fases ao longo de nossas vidas.
A respeito dos protagonistas do filme, a meu ver, eles são interessantíssimos: Enoch por ter um amigo imaginário, Hiroshi (Ryo Kase), um fantasma de um piloto de caça camicase, que é uma espécie de confidente. Ao analisarmos essa questão, de um ponto de vista lógico, ele poderia ser considerado um louco infantil por ter esse amigo imaginário, dado que esse “comportamento” seria típico de crianças. Contudo, quantas vezes não falamos sozinhos, ou vamos ao terapeuta para falarmos, ou telefonamos/nos encontramos com um amigo para desabafarmos ou simplesmente para “jogarmos conversa fora”, enfim, prosear... O falar é algo fundamental em nossas vidas, como também o ouvir. Percebo essa relação de fala/escuta entre Enoch e Hiroshi, especialmente quando jogam batalha naval. Já Annabel é uma apaixonada por pássaros marinhos e pela obra de Charles Darwin. A respeito desse cientista, ela afirma que “ele simplesmente teve a melhor ideia de todos os tempos”, ou seja, a teoria da evolução. Ela é uma jovem que eu rotularia como “descolada” e, apesar de ter pouco tempo para viver, é uma apaixonada pela vida e por Enoch, inclusive diz a ele o seguinte: “Existe um pássaro que acha que morre sempre que o sol se põe. De manhã, ao acordar, ele fica chocado de ainda estar vivo, então canta uma canção linda. Eu canto toda manhã desde que te conheci”.     
Na realidade, o filme explora a questão de valores outros, ou seja, de valores que não são os da maioria de os jovens da sociedade contemporânea e explora a juventude, pelo menos para mim, de fato como ela é, ou melhor, dura, difícil, dolorosa... enfim, como também muitas outras fases de nossas vidas. Apesar de eu explorar certa dureza acerca do filme/da vida, nele há grandes momentos de Carpe Diem, em outras palavras, desde o instante em que Enoch sabe que Annabel morrerá, ambos decidem aproveitar ao máximo/curtir os momentos juntos. Adoro as cenas onde ambos participam da festa de Halloween; mas a cena que para mim sintetiza a poeticidade do filme é aquela em que ambos deitam-se no chão e ele faz o contorno de seus corpos com giz – algo que havia feito apenas com ele no início do filme – o que, possivelmente, aponte para a cumplicidade existente entre eles. Nesse momento, lembro-me de uma cena muito parecida e também linda do genial “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças” (Eternal Sunshine of the Spotless Mind, Michel Gondry, EUA, 2004) onde os protagonistas deitam-se sobre uma camada de gelo e começam a olhar para o céu e Joel (Jim Carrey) diz o seguinte à Clementine (Kate Winslet): “Eu podia morrer agora, Clem. Eu estou feliz. Nunca senti isso antes. Estou exatamente onde queria estar”.              
De meu ponto de vista, o longa Inquietos é um belíssimo filme pelas várias questões apontadas até agora, como também pela adorável trilha-sonora, pelo estilosérimo figurino de Enoch e de Annabel, pela incrível interpretação de Mia Wasikowska e pela forma singela e simples de narrar uma história que é muito mais do que de jovens e de amor. A meu ver, é uma história sobre como lidar com perdas, frustações, desilusões, incompreensões em tempos em que todos se dizem tão conectados, tão online... Um filme que lança um olhar humano, humanista, humanitário acerca da juventude e, por que não, acerca da vida. Dado que mencionei o filme “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças”, para mim, há marcas/memórias que por mais que desejemos não conseguem/não podem ser apagadas de nossas vidas, assim como Clementine não pode ser apagada da memória/vida de Joel e Annabel de Enoch.

Marcos Peter Pinheiro Eça


Enorme abraço a todos,
Marcos.





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