terça-feira, 12 de março de 2013

O Cinema e o Irrepresentável


O Cinema e o Irrepresentável

Curadoria/ Ilana Feldman

Aprofundando a missão do Centro da Cultura Judaica, o ciclo “O Cinema e o Irrepresentável” visa iniciar um trabalho de formação de olhar, assim como de formação de público, em um momento histórico em que nossas vidas são atravessadas e mediadas por todo tipo de imagens. Nesse panorama, aprender a enxergá-las, aprender a ver e ler os filmes que nos cercam, torna-se uma tarefa fundamental para a decodificação de nosso presente e de nosso passado.

Visando tal objetivo, escolhemos como eixo norteador a questão do “irrepresentável”, isto é, a problematização dos limites da representação, pelo cinema, de todo tipo de situações extremas, dentre as quais a experiência da Shoah é certamente a mais emblemática. Mas, muito antes da invenção do cinema e das catástrofes que se abateram sobre o século XX, o segundo mandamento da lei mosaica já postulava que tanto a imagem quanto o nome de Deus não podem ser figurados, fazendo da imagem um lugar extremamente problemático. Desde então, a questão do irrepresentável tem atravessado diversas tradições do pensamento, com a teologia, a filosofia, a literatura, a psicanálise, as artes em geral e o cinema em particular, foco específico de nosso recorte.

Palavra abrangente e múltipla, a dimensão irrepresentável de algumas vivências humanas (sejam situações extremamente dolorosas, sejam situações emocionalmente intensas) permite que discutamos os aspectos estéticos, filosóficos e políticos das mais diversas obras cinematográficas, passadas ou recentes, ficcionais ou documentais, mas todas dotadas de uma relevância singular, atestada pela constante atualidade dos debates sobre a impossibilidade de representação da Shoah. Vindo de longa data, esse debate em torno do caráter irrepresentável de um evento terrível e traumático como o Holocausto judeu tem atravessado diversas manifestações da cultura (como a literatura de teor testemunhal e as artes visuais do século XX), tornando-se uma questão fundamental para a própria história do cinema: seja a história já estabelecida, seja a história ainda por se fazer.

A partir da especificidade de cada filme escolhido (com seus temas, suas opções de estilo e linguagem, seus modos de abordagem), pretendemos, portanto, atualizar, discutir e ampliar a questão do irrepresentável, para além, muito importante ressaltar, de um evento singular como a Shoah. Os filmes escolhidos, entre ficções e documentários, nacionais ou estrangeiros, e não necessariamente focados na temática da Shoah, problematizam a questão da representação – seja por mostrar demais, seja por se recusar ou estar impossibilitado de mostrar. Assim, ao problematizar os limites da imagem, em um momento histórico em que, supostamente, tudo pode ser exibido e repetido, esses filmes nos levam a questionar: O que vemos nas telas? Ficção, manipulação, realidade, verdade ou tudo ao mesmo tempo? Questões que, segundo diversos autores, pertenciam apenas ao cinema, mas que, diante de um mundo-espetáculo em que vivemos, se transformam em questões que dizem respeito a todos nós.

Sobre Ilana Feldman

Pesquisadora, crítica e realizadora. É doutora em Ciências da Comunicação - Cinema pela ECA/USP e pós-doutoranda em Teoria Literária pela UNICAMP. Foi curadora da mostra “David Perlov: epifanias do cotidiano” (realizada na Cinemateca Brasileira em São Paulo e no Instituto Moreira Salles no Rio de Janeiro), a qual deu origem a uma publicação de mesmo nome editada pelo Centro da Cultura Judaica. Em 2013, serão publicados seus livros “Jogos de cena: ensaios sobre o documentário brasileiro contemporâneo” (Contraponto) e a coorganização “O cinema de David Perlov” (Azougue), este último junto com os filmes “Diários” e “Diários revisitados”, de David Perlov, que serão lançados no país pelo Instituto Moreira Salles.

Programação

Rua Oscar Freire, 2500 (Estação Sumaré do Metrô)
14 de março/ 19h30
Kapo” (1960), de Gillo Pontecorvo, com comentários de Cleber Eduardo, crítico, professor e curador. Mestre em Cinema pela ECA/USP, é professor de Teoria do Audiovisual no Centro Universitário Senac e curador da Mostra de Cinema de Tiradentes.
18 de abril/ 19h30
A Questão Humana” (2007), de Nicolas Klotz, com comentários de Noemi Jaffe, escritora, professora de Literatura Brasileira e crítica literária. Escreveu Todas as coisas pequenas , Quando nada está acontecendo , Do princípio às criaturas , Folha Explica Macunaíma , entre outros. Também publicou os livros A verdadeira história do alfabeto e O que os cegos estão sonhando?
09 de maio/ 19h30
“Hiroshima, meu amor” (1959), de Alain Resnais, com comentários de Cristian Borges, professor do Departamento de Cinema, Rádio e Televisão e do Programa de Pós-graduação em Meios e Processos Audiovisuais da ECA-USP. Doutor em Cinema e Audiovisual pela Universidade de Paris 3 - Sorbonne Nouvelle, é cineasta e curador de mostras de cinema, como Agnès Varda - o movimento perpétuo do olhar (2006),  Alain Resnais - a revolução discreta da memória (2008) e Harun Farocki - por uma politização do olhar (2010).
20 de junho/ 19h30
“Viagens”, (1999) de Emmannuel Finkiel, com comentários de Paloma Vidal, escritora, tradutora e professora de Teoria Literária da Universidade Federal de São Paulo. Publicou as ficções A duas mãos (7Letras, 2003, contos), Mais ao sul (Língua Geral, 2008, contos, publicados em espanhol pela editora Eterna Cadencia), Algum lugar (7Letras, 2009, romance) e Mar azul (Rocco, 2012, romance); e os ensaios A história em seus restos: literatura e exílio no Cone Sul (Annablume, 2004) e Escrever de fora: viagem e experiência na narrativa argentina contemporânea (Lumme Editor, 2011). Traduziu, entre outros autores, Margo Glantz e Clarice Lispector. Mantém o blog Escritos Geográficos e é editora da revista Grumo.
11 de julho/ 19h30
"Um homem sério" (2011), de Ethan e Joel Cohen, com Cristian Dunker, psicanalista e professor Livre-Docente do Instituto de Psicologia da USP. Publicou "Estrutura e constituição da clínica psicanalitica" (Annablume, 2011, vencedor do Prêmio Jabuti 2012), “Lacan e a Clínica da Interpretação” (Hacker, 1996) e “O Cálculo Neurótico do Gozo” (Escuta, 2002). É co-organizador da coleção "Cinema e Psicanálise" (NVersos, 2012). Dedica-se à pesquisa sobre as relações entre psicanálise, filosofia e teoria social.
Entrada Gratuita

Seleção de Filmes

Data/ 14/03
Horário/ 19h30
ConvidadoCleber Eduardo
Filmekapo, de Gillo Pontecorvo (Kapo, Itália, 1960, 118'', ficção)
Sinopse: Em Paris, Edith (Susan Strasberg), uma adolescente judia, é presa e deportada com a família ao campo de concentração de Auschwitz. Após sofrer o trauma da execução de seus pais e disposta a sobreviver a qualquer custo, Edith se prostitui aos nazistas, sendo promovida ao posto de Kapo (guarda) dos outros prisioneiros. Porém, a chegada de Sacha (Laurent Terzieff), um prisioneiro russo, a faz recuperar a esperança e lutar pela liberdade. Pontecorvo realiza um retrato de impressionante realismo sobre os horrores do Holocausto. Tal realismo gerou um importante debate à época no meio crítico francês (como o texto “Da abjeção”, de Jacques Rivette) e até hoje vem despertando as mais interessantes discussões.
Ficha técnica
Atores/Susan Strasberg, Laurent Terzieff, Emmanuelle Riva
Direção/ Gillo Pontecorvo
Idioma/ Italiano
Legendas/ Português, Inglês, Espanhol
Ano de produção/ 1959
País de produção/ Franca, Italia, Iugoslavia
Duração/ 118 min.
Distribuição/ Vintage Films
Cor/ Preto-e-branco
Data/ 18/04
Horário/ 19h30
ConvidadaNoemi Jaffe
FilmeA Questão Humana, de Nicolas Klotz (La question humaine, França, 2007, 143’, ficção)
Sinopse: Simon Kessler (Mathieu Amalric) é um psicólogo no departamento de recursos humanos de uma corporação petroquímica franco-alemã. A gerência solicita que ele investigue o diretor geral da instituição, Mathias Jüst (Michael Lonsdale), que tem apresentado sinais de perturbação. A percepção de Simon fica caótica com a companhia de Mathias. A experiência afeta seu corpo, mente, sensibilidade e vida pessoal. Com isso, a calma que fez dele um respeitado profissional, começa a desaparecer, enquanto o passado obscuro emerge. Baseado no romance francês “A questão humana”, de François Emmanuel.
Ficha técnica:
Atores/ 
Mathieu Amalric, Michael Lonsdale, Edith Scob, Jean-Pierre Kalfon, Lou Castel
Direção/ Nicolas Klotz
Idioma/ Francês
Legendas/ Português, Inglês
Ano de produção/ 2007
País de produção/ Franca
Duração/ 141 min.
Distribuição/ Imovision
Cor/ Colorido
Data/ 09/05
Horário/ 19h30
Convidado/ Cristian Borges
Filme/Hiroshimameu amor, de Alain Resnais (Hiroshima, mon amour, França, 1959, 90’, ficção)
Sinopse: “Hiroshima meu amor” é o primeiro longa-metragem do diretor francês Alain Resnais, sobre uma atriz francesa (Emmanuelle Riva), que está em Hiroshima para participar de um filme sobre a paz. A locação do filme é o lugar exato onde a bomba foi detonada. Durante a filmagem, que acontece em 1959, ela acaba se envolvendo com um arquiteto japonês (Eiji Okada), que sobreviveu ao bombardeio. Ele a faz relembrar seu primeiro amor, um soldado alemão (Bernard Fresson) que conheceu em Nevers, no final da Segunda Guerra Mundial. O filme é entrecortado com memórias dos dois protagonistas, deixando implícito, algumas vezes, a época em que está decorrendo a ação. Baseada nas crônicas de Marguerite Duras, que também escreveu o roteiro e os diálogos. A fotografia em tons cinza de Sacha Vierny e a música romântica de Giovanni Fusco e George Delerue realçam o realismo poético das belas imagens deste filme de Resnais.
Ficha técnica:
Atores/ Emmanuelle Riva, Eiji Okada, Stella Dassas, Bernard Fresson
Direção/ Alain Resnais
Idioma/ Francês
Legendas/ Português, Inglês, Espanhol
Ano de produção/ 1959
País de produção/ Franca
Duração/ 90 min.
Distribuição/ Continental
Cor/ Preto-e-branco
Data/ 20/06
Horário/ 19h30
Convidada/ Paloma Vidal
Filme/ Viagens, de Emmanuel Finkiel (Voyages, França/Polônia, 1999, 111 min, ficção)
Sinopse: Ligadas pela lembrança do holocausto, três mulheres judias que estiveram em campos de concentração procuram seus parentes próximos. Riwka (Shulamit Adar), de 65 anos, viaja num ônibus de turismo entre Varsóvia e Auschwitz; Regine (Liliane Rovère), da mesma idade, acha que encontrou seu pai, um velho desmemoriado, e Vera (Esther Gorintin), uma senhora russa de 85 anos, acaba de mudar para Israel para viver seus últimos anos. Primeiro longa-metragem do diretor Emmanuel Finkiel, recebeu o Prêmio da Juventude na Quinzaine des Réalisateurs em Cannes.
Ficha técnica:
Atores/ Shulamit Adar, Liliane Rovère, Esther Gorintin, Natan Cogan, Mosko Alkalai
Direção/ Emmanuel Finkiel
Idioma/ Francês
Legendas/ Português
Ano de produção/ 1999
País de produção/ Franca, Polônia
Duração/ 111 min.
Distribuição/ Vintage
Cor/ Colorido
Data/ 11/07
Horário/ 19h30
Filme/ Um homem sério, de Ethan e Joel Cohen (A serious man, EUA, 2009, 106’, ficção)
Sinopse: Numa cidade do interior dos Estados Unidos, em 1967, Larry Gopnik (Michael Stuhlbarg) é um correto cidadão judeu-americano, pai e professor universitário de física, quando vê sua vida perder o controle: sua esposa, Judith (Sari Lennick), anuncia que quer o divórcio e diz que está apaixonada por um de seus amigos, Sy Ableman (Fred Melamed). A partir daí, Larry Gopnik passa por várias situações inusitadas - sofre ameaças e sabotagens no trabalho, recebe tentativas de suborno de alunos, é roubado pela própria filha adolescente e é provocado pela vizinha que se bronzeia nua. Em meio a toda essa confusão tragicômica, Larry procura três rabinos para aconselhá-lo. Mas o sentido para tudo o que lhe acontece – se é que há sentido – parece estar em outro lugar.
Ficha técnica:
Atores/ 
Michael Stuhlbarg, Richard Kind, Sari Lennick, Fred Melamed
Direção/ Ethan e Joel Cohen
Idioma/ Inglês
Legendas/ Português
Ano de produção/ 2009
País de produção/ Estados Unidos
Duração/ 106 min.
Distribuição/ Universal
Cor/ Colorido
Abraço cinéfilo a todos e nos veremos lá,
Marcos Êçá.

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