terça-feira, 26 de março de 2013

Mirando seu espelho, Daniel Ribeiro faz filmes que refletem uma geração

Mirando seu espelho, Daniel Ribeiro faz filmes que refletem uma geração

“Hoje está claro pra mim que a ausência de personagens que me espelhassem foi um dos motivos centrais pelo qual eu fui fazer cinema”, diz diretor de "Todas as Coisas Mais Simples"

Daniel Ribeiro, 30 anos, está acostumado a receber mensagens de agradecimento. Toda semana chegam e-mails, recados no Facebook, pedidos de amizade, além de curiosas e inventivas homenagens de seus fãs. Sim, fãs. Raridade entre os diretores de cinema no Brasil, ele tem um grupo atuante de admiradores - brasileiros e estrangeiros. E Daniel, veja só, acabou de filmar seu primeiro longa-metragem, ainda nem lançado, "Todas as Coisas Mais Simples" (já incorporado por esses mesmos fãs como #TodasAsCoisas). O que significa dizer que - mais raro ainda -, ele é um diretor conhecido e, em certa medida, venerado, por seus dois curtas-metragens: "Café com Leite" e "Eu Não Quero Voltar Sozinho" (Veja os dois filmes na integra no final da matéria).
O fenômeno acontece por uma combinação feliz de ideias: os dois curtas têm como protagonistas jovens personagens gays cuja sexualidade é uma questão tratada com simplicidade - tanto quanto seria, por exemplo, nossa preferência por passar requeijão ou manteiga no pão. E ambos os filmes estão no Youtube, tendo mais de 2 milhões de visualizações cada, um alcance que pouquíssimos filmes brasileiros têm em sua vida inteira.

A relação que centenas de adolescentes (às vezes nem tão adolescentes) têm hoje com o trabalho desse diretor se explica melhor a partir de um flashback. Vamos a ele.

Daniel Ribeiro estava começando sua graduação em Audiovisual na ECA-USP quando Jack McPhee surgiu. Daniel, morador de São Paulo, estudante de cinema, pouco dado a esportes, real. Jack, morador de Massachusetts, estudante da Capeside High, jogador de futebol americano, fictício. A distância entre os dois seria incalculável. Mas uma característica em particular transformou Jack no espelho de Daniel e de milhares de outros adolescentes quando, em 2000, aquele viril e renascentista jovem gringo saiu do armário sendo protagonista do que viria a ser o primeiro beijo entre dois homens na TV aberta nos Estados Unidos, em um episódio memorável da série Dawson’s Creek.

“Lembro que aquilo foi tão importante pra mim que eu falava: ‘Meu, quero fazer isso também, quero mostrar esse tipo de história gay’”. Por “esse tipo de história" ele quer dizer contar tudo da perspectiva de personagens familiares a ele mesmo: meninos que não correspondem às molduras estereotipadas em que a dramaturgia engessa os gays no cinema e na TV.
Daniel sabe a urgência da mudança no enquadramento dos personagens gays no cinema. Durante seus meses finais de faculdade, se dedicou justamente a estudar a maneira como o cinema nacional lidou com essas pessoas. “Em uma primeira fase, tínhamos sempre a visão negativa e estereotipada do gay, que era quase sempre o vilão, o marginal. Há uma segunda fase, em que se começa a se falar do personagem gay, ainda que colocando a homossexualidade dele como uma questão a ser discutida. E, mais recentemente, vemos uma terceira fase, que é quando o personagem é gay, mas essa é só uma das características dele.”

TRIÂNGULO AMOROSO

O sucesso do segundo curta de Daniel, "Eu Não Quero Voltar Sozinho", aconteceu porque, assim como o diretor se identificou com a história de Jack lá atrás, vários adolescentes (a maioria brasileiros, mas muitos estrangeiros também) viram naquele filme o romance que finalmente entendeu que todo adolescente, independente de orientação sexual, é um ser que, em plena ebulição hormonal, sofre sempre de febres românticas, pueris, idealizadas. No filme, Leonardo (Guilherme Lobo) é um menino cego cuja melhor amiga, Giovanna (Tess Amorim), é secretamente apaixonada por ele. Entra em cena o terceiro elemento, Gabriel (Fabio Audi), um novato no colégio que rapidamente vai despertar em Leo algo completamente inédito.

“Muita gente me escreve esse tipo de coisa: ‘Ah, finalmente um filme que não trata os gays como sexo apenas’. E é isso: no fim das contas, é mais uma história de amor dessa fase da vida, aquela coisa pura e cristalina da adolescência”, explica.
Ainda sem previsão de estreia, seu primeiro longa, "Todas as Coisas Mais Simples" - o primeiro filme brasileiro centrado em adolescentes gays -, é um prolongamento do sucesso de "Eu Não Quero Voltar Sozinho". Partindo do mesmo núcleo de personagens, Daniel acrescentou mais camadas ao trio central e inseriu uma nova personagem feminina para criar tensão maior entre Gabriel e Leo.

Ciente de que a expectativa com a estreia de #TodasAsCoisas é grande – o que ficou evidente na disputada corrida para escalar o time de figurantes da história –, Daniel sabe que essa empatia que os adolescentes têm com seu trabalho vem da “abordagem de espelho” que ainda faz tanta falta à identidade e visibilidade da comunidade LGBT. “Sempre ficava incomodado com a ausência desses personagens e me perguntava: ‘Será possível que ninguém está mostrando pessoas como eu?´”
Admirador do trabalho de diretores como Sofia Coppola, David Fincher e Wong Kar Wai, ele revela: “Hoje está muito claro pra mim que essa ausência de personagens que me espelhassem foi um dos motivos centrais pelo qual eu fui fazer cinema.”

Veja abaixo o curta:"Eu Não Quero Voltar Sozinho"

http://www.youtube.com/watch?v=1Wav5KjBHbI

Veja abaixo o curta: "Café com Leite"

http://www.youtube.com/watch?v=VjSVkcAWaA0

Em: http://igay.ig.com.br/2013-03-25/mirando-seu-espelho-daniel-almeida-faz-filmes-que-refletem-uma-geracao.html acesso em 26/03/2013.

Abraço afetivo a todos,
Marcos Eça.


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